Era quase enlouquecedor. O barulho dos carros apressados na
rua, o grito exagerado das crianças brincando, o vizinho do andar de cima
arrastando os móveis. Sempre as mesmas coisas, os mesmos lugares, pessoas,
sons, cores. Tudo sempre com aquele gosto amargo. Ela sentia os músculos
contraírem e enfiava as unhas na coxa na esperança de que aquela sensação
passasse logo. O maxilar ficava dormente com a pressão da mordida que dava sem
perceber. Escorada na sacada do apartamento Bianca acendeu um cigarro e
cantarolou aquela música do Led que acalmava seus nervos. O fedor da fumaça
misturado com o de terra molhada embalavam um vai e vem em seus quadris, como
uma mãe embalando o próprio filho. Sua cabeça balançava levemente de um lado
para o outro e com os olhos fechados ela sentiu por leves segundos o alívio que
o nada traz. Era pouco, mas o suficiente para aguentar o próximo dia.